O pretexto para jantar, tinha sido a necessidade de ambos conversarem, andavam há dias a adiar o encontro e trocavam mensagens breves, numa tentativa vã de adiar a conversa e de algum modo cada um se controlar e não desvendar o que queriam dizer. No fim de jantar, enquanto falavam onde se seguiria o café, a troca de olhares indiciou que naquela noite passavam bem sem a dita bebida, que as palavras teimavam em querer sair e que se arrastavam violentamente atá à garganta, mas que se enrolavam em forma de nó e por ai continuavam.
Ela tentou várias vezes, iniciar a conversa, começava a falar e rapidamente mudava de assunto, brincava com os elásticos, presos ao pulso, mudava de lugar no sofá e terminava as frases sempre da mesma forma: - haiii!
Ele percebia a dificuldade e tentava ser ele a resolver a questão, tentava pegar no que restava das palavras que ouvia e tentava construir algo que embora não fosse lógico, parecesse pelo menos, tentava construir frases, procurava acima de tudo descobrir se o motivo e razão da conversa eram os mesmos. Mas pouco ou nada avançavam.
O tempo foi passando, as conversas andaram, correram até como habitual neles, sobre temas e assuntos tão distantes entre si, que mais parecia uma conversa entre pessoas desconhecidas, ora falavam do tempo, ora falavam de música ou de outra coisa qualquer.
Olhavam-se mutuamente, procurando cada um descobrir o que o outro pensava e ao mesmo tempo encorajar ou arranjar forças para ser ele a começar a tal conversa.
Mas ninguém manda no relógio e os minutos somam-se para dar lugar a horas, com a cadência certeira de que a cada 60 segundos se conta mais um. E nesse ritmo aparentemente lento, o final da noite aproximou-se rapidamente e os olhares intensificaram-se.
Já com meias despedidas feitas, finalmente sentaram-se mais próximos, afastaram almofadas e de olhos nos olhos, mais ou menos em simultâneo disseram a mesma coisa: -isto é complicado, mas é mesmo assim, se fosse fácil... mas não é! Ficamos por aqui... é melhor assim, não é?
Mesmo cada um procurando no outro uma reacção que desse força e resposta afirmativa à última questão, foi notório o alivio dos dois. As palavras que ficam por dizer, magoam mais e causam mais danos que as que se não dizem e neste caso, ambos sabiam que havia de chegar o dia em que teriam que conversar e adiar esse dia e conversa, só causaria mais angustia.
Apesar do final, saíram de mão dada até ao carro, ele levou-a a casa e deixou-a com um beijo na testa, de boa noite e de despedida...
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É curiosa a linguagem dos olhares, dizem que os olhos são o espelho da alma e que com o olhar conseguimos por vezes dizer tantas coisas, quantas as que queremos por vezes esconder.
A cumplicidade entre duas pessoas, passa muitas vezes pelas palavras que não são necessárias dizer, a sensação de total sintonia, a compreensão mutua no silêncio. Frases inteiras, são substituídas por simples olhares.
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