quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Nos últimos tempos tenho colocado textos antigos, que cheguei a ter o antigo blog e acima de tudo textos que me fazem lembrar alguém, uma época e em especial, que me fazem lembrar e pensar na pessoa que era, que sou e no que mudei. Este é apenas mais um desses textos...

"Hoje...

Hoje queria um abraço. Um dos grandes, daqueles em que tudo à volta pode cair, sem sequer notarmos.
Hoje queria um sorriso. Um grande, daqueles teus, capaz de iluminar a sala e fazer desaparecer a chuva.
Hoje queria uma conversa. Uma das nossas, longas e sobre tudo, das que fazemos esgotar o cha do bule uma e outra e outra vez.
Hoje queria ouvir-te dizer sim. Um sim, diferente dos teus "talvez", dos teus "vamos ver e diverte-te entretanto".
Hoje queria-te aqui, perto, não necessariamente ao meu lado, mas à distancia de um olhar ou a uma suficientemente curta que pudesse sentir-te o perfume.
Hoje, hoje queria abraçar o mundo, num abraço profundo onde pudesse ter tudo e para isso bastava que estivesse aqui, à distancia de um abraço, à distancia de um sorriso, à distancia de uma conversa...
Hoje, bastava-me ouvir-te dizer : Também gosto de ti...


Há um ano, falava de alguém desta forma, queria alguém desta forma, próxima, presente, à distancia de uma abraço, de um beijo mais demorado ou apenas na proximidade de uma longa conversa.
O sim que tanto pedia na altura, chegou tarde, desfasado no tempo e quase em forma de alternativa, uma segunda escolha. Entre encontros e desencontros, o tempo passou e o encanto quebrou-se, deu lugar a saudade e a uma eterna incerteza sobre o que poderia ter acontecido.
Chegou alguém entretanto. Cheia de novidades e coisas novas, diferente, mais ousada, mais directa, bem menos tímida e igualmente grande em mistério. O tempo voou e o encanto transformou-se em cumplicidade, os afectos deram lugar a amizade a carinho e preocupação e o desejo, transformou-se em companhia, em ritual, em coisa nenhuma...
Os assuntos e interesses em comum, que alimentavam conversas longas, debates e troca de opiniões, esgotaram-se. O silencio em certas alturas, tornou-se sufocante e a necessidade de ar foi-se revelando cada vez mais clara, dando lugar a encontros isolados, cada mais afastados, mais distantes no tempo e na relação... mas é alguém que merece o melhor e onde o carinho continua presente, apesar da distancia.
E de repente, há alguém que aparece. Mais uma vez, e como quase sempre, sem saber como se acedeu o rastilho... apenas dei conta que já ardia.
O riso era conhecido, o sorriso enorme, as conversas fáceis, longas, cheias de pontos em comum, a cumplicidade quase familiar, as distancias foram encurtado e as barreiras derrubadas. A ilusão, feita balão com hélio, subiu, deixou a segurança dos pés assentes na terra e fez-se aos céus, elevou-se sem apoios... foi grande e esteve a centímetros de ser enorme. Tudo parecia fácil, natural, tendia para um equilíbrio de forças, princípios mínimos de energia onde a estabilidade é máxima e onde a repulsão e atracção se equilibravam... estavam (parecia-me a mim) a ser conseguídas, atingidas sem "gasto de energia", de uma forma natural... tudo me parecia natural...
Mas... tal como apareceu, fez questão de desaparecer. Mostrou-se, deu-se um pouco a conhecer e retirou-se, fechou janelas, portas, cortou com visitas, diminui conversas, espaçou os encontros, aumentou os silêncios e por fim afastou-me...
E num emaranhado de coisas, pessoas, ideias, projectos, vontades, trabalhos, empregos, sonhos, necessidades, memorias , contas, planos, desejos, ausências, silêncios, conversas, sorrisos, abraços, beijos, segredos trocados, segredos pedidos e outros perdidos, conquistas e derrotas... os dias continuam a chegar ao fim, as noites terminam com o nascer do sol.
Hoje em dia, as caminhadas são feitas de cabeça baixa, de olhos no chão, é-me mais fácil aceitar e dizer que não vi, que não percebi ou que não consegui ver, do que dizer que conheci e deixei escapar, dizer que vi e não soube reconhecer, ou pior dizer que vi, conheci, mas não consegui ser interessante ao ponto de cativar...
Ás voltas com os dias, feito tambor de máquina de lavar, vou filtrando e sendo filtrado, deixo partes de mim nas pessoa que se afastam, trago partes de alguém, sempre que conheço, vou-me construindo e continuo à espera que alguém me diga : Também gosto de ti..."

2 comentários:

Ana disse...

Descobri hoje o teu blog. Vim cá ter através de um comentário teu noutro blog. Adorei este texto! Só alguém com uma enorme sensibilidade e percepção das situações é capaz de se expressar desta forma, os meus parabéns por isso! Vou continuar a seguir-te! :)

Zé Carlos disse...

Ola Ana, obrigado pela visita e pelo comentário. És muito bem vinda a comentar e a passar pelo blog, sabe bem saber que alguém acaba por nos ler :-)
Quanto ao texto, modéstia à parte, é um dos que gosto mais, pelo que me transmite e pelas pessoas que recordo quando o re-leio :-)
Somos muitas vezes, "obras" de várias pessoas, sinto-me assim de vez em quando :-)

Vai dizendo coisas e vai passando por cá ;-)